O Rum rompe o silencio numa sequência de toques avisando a todos que a gira vai começar. Me ajeito na cadeira e estico o pescoço buscando uma melhor posição para poder acompanhar o inicio da gira. Os pontos vão sendo cantados e dançados em consonância com os dos atabaques que agora se somam em notas que se alternam ao comando do mestre Ogã. Impossível não se emocionar com esse momento de magia e espiritualidade que alimenta a alma. Assim venho conduzindo minha caminhada ao logo dos anos, visitando novas casas, conhecendo pessoas e rituais que parecem diferentes, mas que na verdade são exatamente iguais em sua essência. Me recordo a primeira vez que fui a um terreiro. Levado pela curiosidade, mantinha-me acuado em um dos cantos do pequeno espaço, numa tentativa de manter o anonimato. Mas minhas visitas se tornaram frequentes e isso não passou despercebido pela Mãe no Santo que logo me convidaria para participar da gira. Passei a frequentar assiduamente e não tardou para que minha Mãe no Santo me anunciasse que eu era filho de Ogum. Ogunhê! Orgulhoso passei a carregar a bandeira do meu Pai de cabeça, honra-lo de todas as formas e aprendi a sentir sua presença nos momentos de necessidade. Foram anos de aprendizado e crescimento espiritual, mas por força do meu trabalho tive que mudar de cidade e consequentemente de terreiro. A nova casa possuía uma egregora iluminada e desta vez não hesitei em pedir ao Pai no Santo que me permitisse fazer parte da gira. Com o passar dos meses o Pai do terreiro me orienta a começar a cuidar de Oxalá por ser esse Orixá o dono do meu Ori. Fiquei muito confuso e resolvi procurar uma outra casa tendo como objetivo tirar a dúvida que existia em minha mente. Os búzios foram lançados várias vezes e por fim a Mãe no santo anunciou que o Orixá Xangô era o dono do meu Ori. Busquei a solidão para refletir meu momento de incertezas, decidi então viajar até minha casa de origem. Lá chegando fui recebido por pai Guiné, que sentado no banquinho de toco me abraçou como sempre fazia e me disse as seguintes palavras: “meu filho! todos os Orixás vivem de alguma forma dentro de você, mas anos atrás foi Ogum quem primeiro lhe tocou, e se não era Ele seu verdadeiro pai, com certeza lhe adotou como filho. Liberte seu coração!” Chorei nos ombros do meu querido paizinho preto, e feliz, novamente levantei bem alto a bandeira de Ogum. Ogunhê meu Pai!
Por Wilson de Omulu
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