domingo, 1 de setembro de 2019

Oração à Dama da Noite


Ela é um ser espiritual do bem, que ajuda quem merece com elegância e cordialidade, não a procure para fazer o mal à alguém, pois isto ela não fará, não se engane, pomba-giras não são demônios e nem capetas, elas são guardiãs, muito se deturpa por ai e espíritos trevosos muitas vezes usam seus nomes, mas não são elas!

Rainha das rainhas, onde a noite é sua morada,
proteja-me de meus inimigos ocultos e declarados.
Faça com que àqueles que querem o meu mal não me veja
e nem me ouça.
Pomba-gira Dama da Noite que caminha ao luar, venha à minha frente e proteja meu caminhar.
Guia meus passos errantes e ajuda-me a lutar.
Meus inimigos aos meus pés ficarão, Dama da Noite é quem vai derrubar, com as forças da natureza e a proteção dos Orixás.
Senhora Dama da Noite, que atua na luz e na lei do nosso Divino Criador, nós te pedimos que com vossas forças e irradiações divinas vós nos ajude, esgotando em nós todos os vícios que fazem mal à nossa alma, nosso espírito e nosso corpo. Que vós equilibre nosso emocional, despertando em nós as vontades do nosso Divino Criador.
Pedimos também, Senhora Pomba Gira, que nas irradiações da nossa Mãe Oxum vós nos mostre o melhor meio de amar, respeitar e ajudar a nós mesmos e aos nossos semelhantes, para que assim nosso íntimo seja reformado. E que, nas irradiações de nossa Mãe Iemanjá vós leve para as profundezas do mar sagrado todas as nossas dores, aflições e tormentos, fortalecendo o nosso desejo pela vida. E que, junto com a Mãe Nanã, vós cure todos os males do nosso espírito, da nossa matéria, e com nossa Divina Santa Sara e o povo cigano vós corte, desmanche e quebre todas as ações negativas enviadas a nós para que, livres e felizes, possamos seguir nosso caminho e cumprir nossa missão com vosso amparo divino.
E que, junto nosso Pai Ogum, com sua força e proteção, que possamos vencer todas as batalhas de nossas vidas!!!
Que assim seja!!!

A CAVEIRA SEGURAVA UMA ROSA AMARELA


Minha estória começa onde minha vida passa a fazer sentido e minha memória me permite lembrar, acredito que por volta dos meus nove anos.
De origem muito humilde eu era a caçula das oito irmãs que compunham a família de mestre Pedro e Iara, trabalhadores da terra, tinham permissão do senhor feudal para tirar daquele pedaço de chão o sustento das filhas. Nas horas em que não estava no campo, papai que tinha herdado de vovô grande habilidade em fundir metais, fabricava facas, punhais e espadas especiais que depois de prontas eram enviadas ao senhor dos campos, que presenteava os importantes do reino.
Todas as manhãs eu acordava com o som dos pássaros e o cheiro forte do café que mamãe acabara de passar no bule enorme, a preguiça me fazia esticar o corpo, mas eu permanecia deitada por mais algum tempo,  apreciando a natureza pela minha janela que mais parecia um quadro pintado, com certeza pelo criador dos mundos.  Aos nove anos de idade, eu desconhecia os problemas que meus pais tinham, e todos os dias, depois de ajudar nos afazeres de casa, corria para o campo junto com as crianças da vila, inventando todo tipo de brincadeiras, caçando borboletas, e a tardinha tomava banho no rio antes de voltar para casa.
Eu tinha completado quinze anos a poucos dias, naquela tarde de junho tive meu sono interrompido pelo gritos de papai ordenando que as portas e janelas dos quartos fossem trancados. Homens do Arcebispo chegaram a galope, como que tentando surpreender os moradores, que morriam de medo dos soldados, tamanha a brutalidade com que tratavam os colonos. Não sabíamos o que estava acontecendo, mas dava para se ouvir papai argumentando aos gritos sobre algo que nem imaginávamos iria alterar o rumo das nossas vidas. A porta do quarto foi derrubada e eu tomada pelos braços a força, fui arrastada para fora de casa e colocada sobre a cela de um cavalo, que pude notar tinha a marca do senhor dono de todas as terras. Minha cabeça doía muito, o medo era insuportável, virei a cabeça enquanto partíamos e pude ver que meus pais estavam imóveis, sentados na varanda de ramos, mais tarde soube que minhas irmãs foram vendidas como escravas para mercadores que vinham de terras além mar. Eu tinha crescido, tornei-me mulher e era muito comum naquele tempo os senhor dos campos arrancar de seus lares meninas bonitas, e transforma-las em damas de companhia e amantes dos homens de confiança do senhor das terras. Minha vida passou a ser um pesadelo, pois era obrigada e servir de todas as formas aqueles que destruíram minha família, mas confesso que o desejo de vingança me permitia sobreviver e esperar paciente o momento de dar o troco. Minha beleza era minha grande arma,  aprendi a usar meu charme, e transitava pelos corredores do palácio a qualquer hora, sempre cortejada pelos moradores ilustres e visitantes que vinham de outros reinos. A velha duquesa e esposa do Senhor das terras, pouco aparecia, mas quando o fazia, sempre de posse de uma rosa vermelha nas mãos, não disfarçava seu desprezo por mim, como forma de provocação eu me apresentava com uma rosa amarela, sinônimo de disponibilidade.
Na festa de 15 anos da única filha do Senhor e Duque, a movimentação era intensa para que nada saísse errado. Quando o sol se pôs, o salão estava cheio, a música e danças animavam os presentes que aguardavam os anfitriões. Caminhava eu rumo a festa, quando cruzei com a aniversariante no corredor. Linda, ela segurava uma rosa vermelha e eu como de costume trazia uma rosa amarela. Vi nesse momento uma oportunidade de incomodar a duquesa, então sugeri a menina que trocasse sua rosa vermelha pela minha amarela que era muito mais vistosa, o que ela aceitou de pronto. Quando entramos no salão alguém abordou a menina e lhe serviu uma bebida,  timidamente tragou o líquido num só gole, a Duquesa que de longe observava, saiu correndo aos gritos em direção da filha, chamando a atenção de todos que não conseguiam compreender aquele gesto incomum. Ela abraça a filha que desfalece, e morre em seus braços. A duquesa se aproxima de mim e diz que eu tinha matado sua filha e ordena que eu seja presa imediatamente. Condenada a morrer de fome, fui levada ao calabouço, onde fui acorrentada a parede, de frente a um espelho,  para que eu pudesse ver minha morte. Para prolongar meu sofrimento apenas uma dose de água me era servido todos os dias. Depois de passados muitos dias eu já não sentia fome, pude ver minha beleza se transformando em algo horrendo, até que sem forças, olhei para o espelho pela  última vez e vi apenas a imagem de uma caveira segurando uma rosa amarela em uma das mãos, eu estava livre enfim……
Laroiê Rosa Caveira
Por: Mãe Cristina de Iansã

Quem é meu Pai de cabeça?


2016-09-22 01.07.26
O Rum rompe o silencio numa sequência de toques avisando a todos que a gira vai começar. Me ajeito na cadeira e estico o pescoço buscando uma melhor posição para poder acompanhar o inicio da gira. Os pontos vão sendo cantados e dançados em consonância com os dos atabaques que agora se somam em notas que se alternam ao comando do mestre Ogã. Impossível não se emocionar com esse momento de magia e espiritualidade que alimenta a alma. Assim venho conduzindo minha caminhada ao logo dos anos, visitando novas casas, conhecendo pessoas e rituais que parecem diferentes, mas que na verdade são exatamente iguais em sua essência. Me recordo a primeira vez que fui a um terreiro. Levado pela curiosidade, mantinha-me acuado em um dos cantos do pequeno espaço, numa tentativa de manter o anonimato. Mas minhas visitas se tornaram frequentes e isso não passou despercebido pela Mãe no Santo que logo me convidaria para participar da gira. Passei a frequentar assiduamente e não tardou para que minha Mãe no Santo me anunciasse que eu era filho de Ogum. Ogunhê! Orgulhoso passei a carregar a bandeira do meu Pai de cabeça, honra-lo de todas as formas e aprendi a sentir sua presença nos momentos de necessidade. Foram anos de aprendizado e crescimento espiritual, mas por força do meu trabalho tive que mudar de cidade e consequentemente de terreiro. A nova casa possuía uma egregora  iluminada e desta vez não hesitei em pedir ao Pai no Santo que me permitisse fazer parte da gira. Com o passar dos meses o Pai do terreiro me orienta a começar a cuidar de Oxalá por ser esse Orixá o dono do meu Ori. Fiquei muito confuso e resolvi procurar uma outra casa tendo como objetivo tirar a dúvida que existia em minha mente. Os búzios foram lançados várias vezes e por fim a Mãe no santo anunciou que o Orixá Xangô era o dono do meu Ori. Busquei a solidão para refletir meu momento de incertezas,  decidi então viajar até minha casa de origem. Lá chegando fui recebido por pai Guiné, que sentado no banquinho de toco me abraçou como sempre fazia e me disse as seguintes palavras: “meu filho! todos os Orixás vivem de alguma forma dentro de você, mas anos atrás foi Ogum quem primeiro lhe tocou, e se não era Ele seu verdadeiro pai, com certeza lhe adotou como filho. Liberte seu coração!” Chorei nos ombros do meu querido paizinho preto, e feliz, novamente levantei bem alto a bandeira de Ogum. Ogunhê meu Pai!
Por Wilson de Omulu

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