Publicado por:Pai Caio de Omulu
No meu livro "Umbanda Omolocô - Liturgia, Rito e Convergência na visão de um adepto", tem um capítulo inteiro dedicado ao rito de sacrifício de animais. Na verdade realizo uma defesa da necessidade de sua utilização, tentando fundamentá-lo e apresentando, ao meu ver, argumentos consistentes para sua existência.
Assunto polêmico nas rodas umbandistas, tema sem consenso para muitos, não desejo entrar aqui, de forma nenhuma, na validade de seu uso e prática.
O meu intuito é chamar a atenção para um fenômeno que começa a me preocupar como estudioso umbandista, o uso indiscriminado do sacrifício de animais na rotina dos trabalhos espirituais das casas que o praticam.
É incrível como em alguns locais não se faz mais nada, sem que não se tenha um sacrifício de animal pelo meio. Para solucionar qualquer tipo de problema realize uma consulta e depois mate um ou mais bichinhos! Parece que esta passou ser a lei em determinados terreiros.
Não estou falando aqui de sacrifício de bicho de quatro pés (boi, cabra, bode) estou falando do que é mais fácil, cômodo, rápido e lucrativo de se sacrificar o cocoricó, o frango ou a galinha, ou seja, bicho de dois pés.
Nestes recantos que apregoam o sacrifício de animais como solução para todos os males, o axé vermelho (sangue) passou a ser o alimento (oferenda) indispensável, principalmente para Exús, Pomba-giras e os Orixás.
Diante desta realidade, alerta, DIETA JÁ!!! Tem exús ficando preguiçosos de tanto serem alimentados, pomba-giras reclamando dos quilinhos a mais e Orixás se perguntando se este cardápio não muda.
Brincadeiras a parte, cadê as milhares de formas existentes de trabalhos, dentro da riqueza dos nosssos ritos? Cadê as comidas de santo? Os pontos riscados e os ponteiros? Os descarregos de pólvora e os pontos de fogo? A utilização dos elementos da natureza (folhas, ervas, águas, sementes etc.)? Onde foram parar as rezas fortes, os benzimentos, as giras com velas, os trabalhos realizados pela incorporação de entidades, que fazem suas mirongas utilizando vários objetos, sem que necessariamente exista como componente básico o axé vermelho?
Minha gente, o rito de sacrifícios de animais é um ritual de EXCEÇÃO, ou seja, deve ser utilizado somente em casos especiais, situações a margem do normal, após o estudo minuncioso de um caso em particular, ou em rituais específicos e em última instância.
E mesmo assim, se houver um outro caminho, que exista a ponderação de deixá-lo de lado. Por ser perigoso ou incorrer em algum risco? Poderia ser formulado esta pergunta e a resposta seria NÃO!
Tradicionalmente, historicamente, e mesmo como manipulação de determinadas leis magísticas, o derramamento do axé vermelho cumpre o seu papel, tem sua validade e sobrevive, por isso, até hoje.
Engraçado é que terreiros que durante boa parte da sua existência nunca fizeram uso do rito de sacrifício de animais e que por mudança de ritual ou por outro motivo qualquer, passaram a incorporar esta tradição, consideram este fato como uma conquista evolutiva. A bem da verdade, não pode existir evolução espiritual nenhuma ao se dispor da vida de um ser vivo, mesmo que este esteja em uma condição inferior na escala evolutiva.
O pior é que se você for bem mais a fundo em determinados casos, da para perceber que o uso indiscriminado do sacrifício de animais em alguns terreiros existe por conta dos seguintes pontos:
a) É um ritual que provoca um impacto para o consulente;
b) É um rito complexo, que muitas vezes, envolve uma certa quantidade de outros materiais, na maioria das vezes comprado no terreiro, onde se está sendo feito o trabalho, a um custo muito superior ao de mercado;
c) É um rito que gera uma salva ou mão como se fala comumente (pagamento em dinheiro) por corte (animal sacrificado);
d) E, por fim, as partes do animal sacrificado que não são usados, ficam geralmente para a casa, em vez de serem distribuídos com os mais carentes.
Tem gente enriquecendo com isto, tem gente que não sabe fazer mais nada que não envolva este rito, tem que gente que somente encontra solução de alguma coisa se praticar este rito.
Com tudo que expus, quero deixar, bem claro, que se o rito de sacrifício de animais é uma exceção, exceção também são os terreiros que trabalham errado, da forma como descrevi acima.
É fato caro leitor, que dentro do universo umbandista, dos cultos afrobrasileiros e do Candomblé milhares de locais trabalham com este ritual de forma responsável e colocando-o no seu devido papel de rito especial. Outra coisa, evidentemente existem milhares de locais, principalmente no movimento umbandista, que não se utilizam deste ritual e nem por isso os trabalhos por eles realizados tem pouco ou mais valor do que o dos outros.
Como adepto do Culto Omolocô tenho a experiência deste ritual no dia-a-dia da minha vida religiosa, escrevi uma defesa ferrenha no livro citado, acredito na sua utilidade, embora, como também deixei bastante destacado no livro, tenho certeza, que em um futuro bem próximo este rito será substituído por formas mais evoluídas de ritual, não envolvendo mais o sacrifício de animais.
Em, outras palavras, se como adepto cumpri o meu papel de validar o uso responsável deste ritual, fundamentando-o e demonstrando uma linha de raciocínio lógico para sua existência, como cidadão planetário e espírito em evolução, como todos os que se encontram neste planeta, não me vejo em contradição ao afirmar que Sacrifício de Animais não é tudo!
Acreditar na faca como objeto útil para ajudar a cortar o alimento que me mata a fome, não significa aceitar que se use ela para tirar a vida de alguém!
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